sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Sem fantasmas

Sentiu-se sozinho. Sempre soube sobre seu estado de solidão. Era um estado de espírito consciente. Contudo, contava com seus fantasmas costumeiros. Porém naquela noite sabia mais do que nunca que estava sozinho. 
Ouvia latejos do silêncio pularem das paredes de madeira que o cercavam acertarem em cheio suas extremidades e sua alma. Seus fantasmas o haviam abandonado. 
Pensou se poderia mudar o frio que o envolvia: telefone, email, cartas, filmes. Não conseguia alcançar nada disso para senti-los. Disse para si mesmo:
- Que minh'alma nao durma por completo. Teve, pela primeira vez em vida, o temor da morte. Buscou ressuscitar o pouco que notava e acreditava ainda existir. 
Em vão. Tudo em vão.
Amou muitas vezes.Ouvira, ao longo dos anos, os melhores conselhos dos melhores amigos. 
"Ame sempre e não perca a esperança de ser feliz", dizia-lhe um amigo.
"Não se permita desacreditar num mundo de paz e plenitude", ensinava-lhe outro.
Acreditou no bem, na paz, na justiça. Sabia que seu ser era feito para o bem, para acreditar na vida com entusiasmo e esperança. Doou-se aos sentimentos nobres de coração.
Escreveu cartas de amor e amou muito. Amou seus amigos, seus irmãos, a vida, os fins de tarde, os inícios dos dias, o Sol. Foi um ser de luz que transcendeu.
Arrancaram-lhe pedaços.
Desafiaram sua fé em Deus.
Derrubaram-no ao chão.
Levantou.
Mas levantou tantas vezes...
Voltou a acreditar.
Voltou a crer nos melhores conselhos.
O tempo começou a diminuir os dias e encurtou o brilho do Sol.
Jogou-se sobre o bruto concreto dos dias cinzas e passageiros.
A míngua começou dilacerar-lhe.
Fechou-se.
Provou da realidade feia do mundo.
E o que restou-lhe de tudo isso?
O choro inconformado transfigurado na magreza, nas profundas olheiras e no amarelo pálido que lhe tingia toda a pele.
Estava só e sentia medo.
Medo de tudo.
Medo de todos.
Medo do que a vida tinha lhe mostrado e lhe arrebentado.
Estava só.
Tinham-lhe duramente cortado os galhos verdes.
Sombrio e sem fantasmas deitou-se na cama.
E o barulho da queda nao o despertou.
Atritou contra o colchão apodrecido.
Sentiu o apodrecimento ao seu redor e 
percebeu que as lágrimas também já lhe eram companheiras.
Pôs-se ao nada.
E sozinho permaneceu.

 







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